A outra

17.9.16 -


Era mais alta que eu, desbocada à beça e estava atenta a tudo que estava acontecendo naquela balada pura ostentação que tocava eletrônico e não era nada a minha cara. Era maio também e assim que ele virou as costas, ela atacou o meu braço pra confirmar uma suspeita que já havia roubado algumas noites e criando uma colônia de pulgas atrás das minhas duas orelhas: corna. Eu era a mina mais chifruda do mundo e deveria saber. Por quem? Quando começou? Onde? Com você? Mais não disse, mas falou do nosso porta-retratos no quarto dele e que eu deveria abrir meu olho. Não foi necessário.

Rolou uma confusão à altura: primeiro o choque, depois o choro, o empurrão e ouvi do meu, então, companheiro "vai embora, tu tá estragando a minha festa". Os meses que se seguiram demoraram a cicatrizar. Foi foda, muito foda, mesmo. Em meio ao turbilhão, eu tinha um então ex-namorado que negava tudo - só admitiu quando consegui algumas provas, horror dos horrores - e descobertas sem fim de outros casos, affairs e afins que o dito encobria. Eu era traída e, pior: pra cacete, adoidado, corna do milênio. A gente pensa que nunca vamos fazer parte do time das premiadas, mas a verdade atravessa o peito feito bala perdida no alvo certo: ninguém espera.

Ciente da minha condição, comecei a relembrar situações que deveriam ter servido de alerta pra que eu ficasse de orelhas em pé: o fato de ele levar o celular sempre junto, até mesmo pra ir ao banheiro, eu não poder mais usar seu computador, a agressividade, que havia aumentado horrores nos últimos meses, e o desinteresse, que só crescia e crescia - e quanto mais eu ficava desesperada por ele fermentar, o fosso entre nós dois aumentava; o que descobri na análise ser típico dessas situações: quanto mais a gente vai atrás e tenta consertar a merda, mais ela fede.


Faz exatamente dois anos e hoje consigo falar disso com tranquilidade, sem rancor na voz ou qualquer pontada de descontentamento. Porém, se existe algo que me trava e evitaria a qualquer custo é fazer outra garota passar pelo pesadelo que eu tive que encarar, sem chance de escolha. É óbvio, a culpa é do homem. Sempre. Quem tem algum tipo de compromisso com a outra mocinha é o cara, logo, quem deve lealdade e consideração, é ele. Sem dúvida. Longe de mim querer eximir a responsabilidade de quem dá sua palavra e firma um acordo tácito entre duas parte. Mas, poxa, se sei que ninguém vai sair bem desse tipo de situação e que raramente existe "final feliz" para qualquer que seja o casal do triângulo, por que diabos me meteria nessa?

Sei que, na vida real e na maioria dos casos, a culpa quase sempre recai sobre os ombros da mulher. Piranha, vagabunda, ladra de homem; escutamos muitas dessas babaquices quando casais famosos ou de amigos passam por esse inferno. Contudo, eu queria apenas que, como mulher, a outra guria pensasse em mim também. Um segundinho só, rapidão. Que existe alguém sendo feita de trouxa, que poderia ser ela no futuro, que se o cara fala mal pelas costas e mente descarado pra pessoa que passa finais de semana e apresenta pra família, que respeito ele teria por uma foda ocasional? É isso que me faz refletir toda vez que um homem comprometido vem tentar a sorte por aqui: é saber o quão tenebroso é pensar que viveu uma mentira e não conseguir mais confiar em ninguém por ter o peito mutilado, inoperante.

O que eu gostaria de pedir, de coração, é menos egoísmo em falar "ah, mas eu sou livre e desimpedida, ele que se preocupe" e mais empatia em ponderar "mas e se fosse eu? será que já foi comigo? ele tem namorada e no final quem vai sair mais ferido desse tiroteio talvez seja eu, talvez seja ela. ele é que não vale o que come". Se serve de consolo, eu hoje não encaro mais traição como o fim dos tempos e acredito que há uma diferença gritante entre manipular situações e levar adiante um caso e ser infiel por uma noite e nada mais. A outra sumiu da minha vista tão logo quanto apareceu, nunca mais vi. Ele, o meu então namorado, nunca me pediu desculpas - e também não cruzamos por aí, em circunstância nenhuma.

Hoje eu estou bem, mais madura e completamente grata por já ter engolido o tormento e ter tirado só crescimento disso. Posso assegurar que se depender de mim, miga nenhuma vai precisar se defrontar com o pânico de não saber quem é, o que vive, onde está.

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